30 março 2011

De volta pra casa

Mudaram as estações, nada mudou
Mas eu sei que alguma coisa aconteceu
Tá tudo assim tão diferente...

Brasileiro de Longa Distância no Ceará, quarto ano consecutivo. Faltei à última edição, mas parecia que tinha competido lá há poucos dias. Desde que cheguei ao aeroporto, na quinta-feira, as lembranças de uma das minhas provas preferidas vinham à tona a todo o momento. Lembrava do desembarque, da locadora de veículos, do entroncamento da estrada que errei, do hotel...

Cheguei a Cumbuco no fim do dia, sem muito tempo para fazer qualquer coisa além de comer e montar a bicicleta antes de dormir. Ao me deitar, as lembranças das vitórias de 2008 e 2009 se misturavam à expectativa pela prova de sábado. Meu lado racional tentava guardar a empolgação em algum cantinho bem escondido para que ela não atrapalhasse os planos objetivamente traçados, e passei um bom tempo me revirando na cama antes de ceder ao sono.

Acordei tranquila, antes do despertador. “Estranho”, pensei, “achei que ficaria mais nervosa com meu primeiro longo...”

Tomei café apressada pela Vanessa Gianinni, que queria sair antes que esquentasse muito, e saímos de carro para fazer o reconhecimento do percurso. Depois, um girinho de pouco menos de uma hora. Voltei para o carro, guardei a bicicleta... E tranquei a chave dentro.

Esfreguei a testa, pensei um pouco. Tentei abrir as portas e janelas; nada. Meu celular também ficou trancado dentro do carro, junto com a chave do hotel, carteira, bicicleta... Fazer o quê? Consegui carona com a Vanuza Maciel e alguns amigos de Florianópolis, voltei para o hotel e liguei para um chaveiro, que só poderia vir depois do almoço. “Ok, vou sair pra almoçar antes de resolver isso.”

Espere aí: eu ainda não estava nervosa, nem estressada, nem preocupada com o horário..? “Que bom que não foi no dia da prova”, foi o máximo de preocupação que passou pela minha cabeça...


(...) Se lembra quando a gente
Chegou um dia a acreditar que tudo era pra sempre
Sem saber que o pra sempre, sempre acaba (...)

Dia da prova.

Acordo às 4h00 sem sono, sem nenhum músculo travado, sem sinusite atacada. O café da manhã desce fácil, nem sequer sinto que comi demais. Apresso a Talita para irmos logo para a transição e chegamos bem a tempo de estacionar na última vaga perto da largada. Transição arrumada, aquecimento feito, largada separada dos homens... “Que dia lindo!”

Largo mal (novidade...), mas logo depois da primeira bóia passo Susana e Jéssica e colo na esteira da Vanessa. “Nossa, acho que tô mesmo num dia bom... A esteira da Van nunca foi tão tranquila”.

Cogito a possibilidade de revezar, puxar um pouco pra abrir mais das meninas, mas o lado pensante vai logo dando bronca: “nem tente fazer gracinha, Ana Lidia!” – o lado racional tem a voz parecida com a da minha mãe – “você vai precisar de qualquer reserva extra daqui a pouco!”. Tá certo, tudo bem...

Saímos da água eu, Vanessa e Jéssica juntas. Transição equilibrada, mas logo no começo do pedal eu aproveito o dia inspirado pra calçar logo as sapatilhas, baixar no clipe e despachar a amazonense. A Van chega comigo no trecho da rodovia e juntas ficamos até o final da terceira volta – nós, um fiscal de vácuo e, depois de algum tempo, a Susana. O vento aumenta a cada volta, o ritmo começa a cair. E vem bronca de novo: “Ô, cabeça... As duas vão deixar pra corrida; e você?”

Pernas pra que te quero! Lá se vai o extra da natação, mais o extra do descanso forçado pela gripe no começo da semana, mais tudo o que tinha. Vinte quilômetros rangendo os dentes, mas consigo abrir um minuto das meninas. Entro na transição feliz da vida, liderando uma prova depois de muito tempo. Calço meu Speedstar rosa em segundos... “Até quando será que eu consigo segurar a ponta..?”


 
(...) Mesmo com tantos motivos pra deixar tudo como está
Nem desistir, nem tentar, agora tanto faz
Estamos indo de volta pra casa

A versão acústica da música da Cássia Eller não parava de tocar na minha cabeça desde o ciclismo, mas agora parecia mais verdadeira do que nunca.

Eu continuava focada, com as passadas cadenciadas, administrando a vantagem. Eu tinha que completar meu primeiro longo – e, agora que estava tão perto, tinha que garantir meu lugar no pódio.

Com 2km de corrida a Vanessa e a Susana me passaram, correndo juntas. “Tenho mais duas posições”.

Corre, isotônico, corre, Accel Gel, água, corre... “Corre!”

Na terceira de quatro voltas, a Silvinha passou voando; perto dela, Jéssica e, um pouco atrás, Bruna Mahn. “Descer em primeiro e acabar em sexto é sacanagem...”

Faltando menos de 3km para o final a Jéssica me passou, mas eu ainda tinha uma boa vantagem para a Bruna, apesar de ela estar visivelmente correndo melhor. Já estava passando bastante mal do estômago e não conseguia segurar a maior parte dos líquidos que ingeria, começando a sentir os efeitos da desidratação. Mas o quinto lugar era meu...


“Quarto?!? Como assim, quarto..?”

A Jéssica estava uma volta atrás, acabou o dia em sétimo. Vanessa Gianinni, Susana Festner, Silvia Fusco, eu e Bruna Mahn, nessa ordem, formamos o pódio feminino do Campeonato Brasileiro de Longa Distância 2011.

Quer saber? Tanto faz.
Estamos indo de volta pra casa...



Parabéns a todos os atletas que competiram nesse maravilhoso, porém duríssimo, evento – em especial, às minhas amigas e companheiras de RM Elite Team Vanessa Gianinni, Sílvia Fusco e Talita Saab. Parabéns à FETRIECE pela excelente organização e à prefeitura de Caucaia/CE pelo respeito para com os atletas, demonstrado pelo apoio à competição e pelo tapamento de todos os buracos do percurso na véspera da prova.

Obrigada a todos os meus patrocinadores e apoiadores (ASICS, Aqua Sphere, Accelerade, Cia Athlética, Clínica 449 e VéloTech), à minha técnica Rosana Merino, aos meus pais – que foram pra Fortaleza de madrugada para assistir à prova, mesmo depois de uma semana de trabalho em ritmo insano –, e aos queridos triatletas e amigos do triathlon de Fortaleza, que me deram uma força enorme não só durante a prova, mas durante todo esse tempo que me ausentei das provas cearenses. Vejo todos vocês em breve, no Ironman Brasil 2011!

12 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns!

Bel disse...

Bela prova, maravilhoso depoimento. Parabéns pelo empenho e sabedoria a cada batalha. Bj. Bel

Gi Ticianelli disse...

Parabéns pela prova, pela força, pela dedicação!!
Fiquei muito feliz quando soube que você tinha completado a prova em quarto lugar!
Às vezes nos acostumamos com o que fazemos ou convivemos com pessoas que fazem o mesmo que nós ou até melhor e perdemos a noção do significado dos afezeres, por isso deixo aqui minha mensagem para você te parabenizando, porque completar uma prova de triathlon já não é fácil, terminar em quarto é mais complicado e superar um acidente a mais ou menos um ano e terminar em quarto é tarefa para vencedores, não para qualquer um, PARABÉNS!!

Um abraço, Giovanna

Unknown disse...

Parabéns!! Para mim que pude acompanhar a prova, vc é a verdadeira campeã. O calor e o vento que enfrentamos aqui é mero detalhe frente ao que vc já superou... Espero vê-la, ou melhor, competir ao seu lado aqui no Ceará no próximo ano.
Abraço.
Leônidas.

LODD disse...

Tenho certeza que esse vai ser mais um de muitos outros relatos seu que virão que vão me emocionar e inspirar.

Já te falei um monte de vezes e não me canso: "Você é uma inspiração!"

Parabéns porque você merece isso e muito mais.

Bjos

LODD

Miranda disse...

Seu nome é Superação!!Orgulho de você ter superado tudo que passou!!
Muitas vitórias para ti.!!

Abraço,

Glauber.

Anônimo disse...

Parabéns Aninhaaaa
Garra e espírito de campeã é sinônimo de vc!!!! Sucesso sempre.
Bjs
Fer

Blog do chamba disse...

Ana,

Muito bom ter ver competindo em alto nível novamente....parabêns !

Bons treinos pra vc,e .....nos vemos em Floripa !

Bjos

PAULA BICEV disse...

Ana.....
Talvez o "prá sempre" não acaba....talvez o "prá sempre" mude....
bjs e sucesso!
Paula

Gi Ticianelli disse...

Parabéns por domingo, mais um ótimo resultado no GP!!
Um abraço, Giovanna!

Bruno disse...

Parabéns, Ana...Gostei de sentir a maneira que vc está encarando as provas. Isso para mim é fundamental... "O melhor da viagem é curtir a paisagem".

Hadassa disse...

Nossa, adorei esse post. Estou começando no mundo da corrida (e dos blogs)... tenho me apaixonado a cada dia, e ler sobre uma corrida tão empolgante é como se eu estivesse lá. Vou te seguir...

Ótimos KMs pra vc.. =))